terça-feira, 21 de setembro de 2010

Me deixem, ao menos, a última gota


Tudo que é demais sobra. Dona Nilma, vulgo mainha, sempre dizia isso. Ou diz, não sei. Deixei de morar com meus país há mais de 20 anos. Aliás, melhor, eles me deixaram. Voltaram para Salvador e me esqueceram aqui em Brasília. O recado, se entendi direito, é algo como 'tenha limites', 'não exagere'.

Pois bem, estou no limite com o politicamente correto. Tudo que é demais sobra. Proibiram as piadas racistas. Eu aplaudi feliz, nunca as contei e acho um tremendo mau gosto. Proibiram as piadas de português. Fiquei meio assim, né? Eu contava, mas adaptei. Troquei o portuga por um goiano ou sergipano - como bahiano e candango, tenho de implicar com os vizinhos. Proibiram também. Nem da sexualidade dos gaúchos a gente pode mais falar. Daí tiraram as piadas de loira. No começo até fiquei chateado, mas depois constatei a melhoria nas rodas de bar: ninguém mais precisa explicar a piada.

Se o politicamente correto ficasse só no campo humorístico, dava pra levar. Mas a coisa foi espalhando, espalhando. Em pouco tempo, vi que não tinha mais coragem de, mesmo sozinho de madrugada, jogar um papel de bala pela janela do carro. Já até parei de madrugada para pegar no meio do Cerrado um saco do Extra que tinha voado pela janela. Isso foi no passado remoto, porque o politicamente correto agora me impede de usar os sacos de supermercado. Tenho sacolas recicláveis no carro para as compras. Quando as esqueço, levo tudo solto no carrinho e jogo no porta-malas do Fusca, mas antes repito a frase para a moça do caixa: JÁ TEM PLÁSTICO DEMAIS NO MUNDO. Assim mesmo, gritando, para todo mundo ouvir. Dá um gostinho sádico ver os vizinhos olhando para o chão, fingindo atender o celular e pedindo pressa ao caixa.

Já viu porta-malas de Fusca? Quero ver alguém enfiar uma mala lá... E no meu é pior, porque o dono anterior fez o favor de trocar as rodas por umas de aro-sei-lá-o-quê e agora o estepe não cabe no espaço próprio. Bom, para encurtar um drama de novela das oito, em casa, invariavelmente tenho de lavar o bagageiro, porque as guloseimas ficam rolando de um lado para o outro, o porta-malas é inclinado e sempre abre um pote de margarina, quebra um vidro de Cica ou, pior, abre-se a caixa de ovos. Há alternativa? Esse politicamente correto é o vírus mais contagioso que há, parece que penetra na alma.
Mas agora eles foram longe demais. Esses caras do Conselho Suprapartidário, Atemporal, Transcontinental, Poliglota, Pansexual, Multiracial, Interministerial, Trangênero e Ecumênico das Atividade, Atitudes, Condutas e Pensamentos Politicamente Corretos, sediado em Feira de Santana, me despiram do que restava de dignidade masculina.

Primeiro é preciso explicar que há coisa de 15 anos sou submetido à humilhação privada de fazer xixi sentado. Exatamente, eu sei que você está fazendo a imagem mental. Tenho de arriar (talvez arrear fosse até mais bem posto aqui) as calças e sentar no trono só para mijar. A decisão é da Isa, claro. Alega que eu sou muito ruim de mira e que sujava o banheiro todo. Até tentei resistir e argumentar no começo, mas depois que a Pequena nasceu, há doze anos, a patrulha ficou muito mais intensa e entreguei os pontos. Passei a urinar sentado, até porque brigar com quem tem o poder da calcinha é perda de tempo, além de fazer crescer cabelo na mão. Hoje, somos três e moramos numa casa com o ridículo número de seis vasos sanitários. Infelizmente, o luxo chegou tarde demais - não consigo mijar de pé no banheiro de casa, o politicamente correto familiar está registrando no meu DNA.

De volta aos magos do Conselho. Eu desconfiei que uma medida como essa viria a qualquer tempo. Uns anos atrás um colega de trabalho sempre entrava no banheiro, lavava as mãos, secava, pegava uma folha de papel toalha e ia para o mictório. Depois de aliviado, carinhosamente secava com o papel a cabecinha do dele - digo cabecinha sem fazer juízo de tamanho, que não sou destes de ficar medindo o pau dos outro - lavava e secava as mãos novamente. Se a moda pega..., pensava eu toda vez que dava o azar de encontrar com ele no banheiro.

E não é que pegou? Fui a um banheiro num hotel aqui da capital e o que encontro? A abolição da Quarta Lei de Newton! Tá lá um suporte para papel toalha ao lado de cada mijador. Todo homem do mundo, mesmo que odeie física, sabe: Não adianta, por mais que você balance, a última gota é sempre da cueca. Tem que ser assim, é um direito nosso! Aquela bolinha úmida no lado esquerdo do pijama é a prova da nossa masculinidade. Ou era. Agora, estamos obrigados a secar o bichinho. Isso, claro, depois e antes de lavar as mãos. Companheiro, você já fez xixi cinco horas da manhã no inverno de hemisfério norte ou até das nossas serras catarinenses? Olha, Ele fica tão encolhido que para achar só com lupa e pinça.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Ah, os doze...


Pois sim, este é a última e a primeira postagem do Oraite. Morre o Oraite nos Isteits e nasce o Oraiti. Se compliquei, explico. Já são três meses desde a volta da terra-do-Obamão-o-socialista e o velho Oraite continua no ar com uma última mensagem de maio. Voltamos para o Brasil em 15 de junho.

Ainda lá duas pessoas me perguntaram se o blog não teria um fim. Achei um exagero, são só dois leitores (a Isa e um tio-feirense-bancário-e-poeta), meio até dramática esse história de uma mensagem final. E o corre-corre dos últimos dias lá em Asheboro impediram a sentada. Foi duro, ninguém sabe o tanto que a Isinha comprou nos Isteits em três anos, fechamos cinco caixas de geladeira e jogamos num navio. Barco, este, aliás, perdido em algum lugar do Atlântico, se é que não foi parar no Pacífico, desviado pelo peso da carga mal distribuída no porão.

De volta ao calor do velho Planalto Central, à boa falta de (h)umi(l)dade de Brasília, um terceiro elemento me pergunta do blog. Opa, a dupla de leitores pode ser um triângulo. E veio um quarto comentário! Rapaz, ego e jornalista são sinônimos ocultos. Daí, tracei a meta: se doze pessoas perguntarem do Oraite, volto a escrever.

Fingi que esqueci o assunto e deixei a vida seguir. Procurar emprego é foda, nunca tinha feito isso. Os postos de trabalho sempre tinham me achado. E o tempo passando. Como quem não quer nada, passei a fazer um tracinho num papel na escrivaninha toda vez que alguém perguntava do blog.

Eis que o número cabalístico acaba de ser atingido. Ontem, a décima segunda pessoa me perguntou do Oraite. Tenho 12 leitores. Mais leitoras que leitores, para meu deleite e orgulho. Já estou fazendo o perfil sócio-econômico do público-alvo. Será disponibilizado em breve, logo que descobrir uma forma de fazer dinheiro com o blog. Adianto que todo mundo ganha mais do que eu, e apenas este anda de Fusca 86. Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez, onze, doze. Uma dúzia. É tanta gente que não cabe nem em uma Kombi. Me sinto o próprio profeta.

Pois bem, por amor aos 12, em vez de um post-testamento, dou à luz ao Oraiti. Um apanhado do que foram os anos de América do Norte fica adiado, qualquer dia sai no novo Oraiti. E uma desculpa: tentei arrumar um nome melhor, mas fazer brainstorming sozinho é mais chato do que comer boneca inflável.

Visite o velho Oraite.